Foi mais ou menos quando comecei a trabalhar, talvez há uns dez anos, que decidi fazer um seguro de saúde. Sempre tive assistência médica através do trabalho dos meus pais, mas quando comecei a descontar isso acabou-se e então achei prudente ter um seguro. Escolhi a Multicare já nem sei bem porquê, talvez por ser a mais conhecida, ou uma das mais conhecidas. A verdade é que, ao longo destes anos, sempre achei que aquilo era uma entidade um bocado estranha. Para me explicarem qualquer coisa tinha de estar meia hora ao telefone e passar por 14 departamentos, nunca percebi muito bem como é que funcionavam os reembolsos (enviava as facturas e esperava pelo melhor) e achava toda a assistência ao cliente assim um coisa meio etérea. Mas pronto, a verdade é que também nunca tive chatices de maior, a cobertura de serviços é boa, por isso deixei-me estar. Aliás, não só me deixei estar como incluí o Mateus no meu seguro e fiz um up-grade do mesmo, já tinha o seguro mais elevado de todos. E tudo corria relativamente bem até ter ido ao médico em Abril e o cartão da Multicare não passar. Oi? Como assim? Liguei de imediato a saber o que se passava e fui informada que o serviço estava suspenso por falta de pagamento desde Fevereiro. E aqui entra a parte do assumir de culpas. Na data em que o pagamento caiu eu não tinha esse dinheiro disponível na minha conta à ordem, porque nunca lá tenho muito dinheiro, só o essencial para o dia-a-dia. Segundo me disseram depois, foi enviada uma carta a avisar que o pagamento seria cobrado no dia x. Uma vez mais, culpa minha que não vi a carta, ou que a vi e não prestei a devida atenção. Certo é que o pagamento chegou (é anual) e a cobrança não foi feita por falta de dinheiro na conta. Tudo bem, uma vez mais, sublinho, a culpa foi minha. Mas o seguro foi cancelado de imediato e ninguém me avisou. Ninguém tentou fazer nova cobrança, ninguém tentou averiguar o que se passava. Foi preciso eu ir ao médico DOIS MESES depois para me dar conta da situação. Cancela-se um serviço e não se avisa o cliente, fantástico. Ainda por cima estamos a falar de um seguro de saúde, não é propriamente o mesmo que cancelarem-nos o telefone por falta de pagamento.
Mas bom, assim que soube o que se estava a passar pedi para que dissessem como proceder para pagar o que estava em falta e reactivar o seguro. Seguiram-se muitas e muitas chamadas para a Multicare ao longo destes últimos meses, sempre a ouvir coisas diferentes. Que a situação estava a ser analisada, que estava no departamento não-sei-quê, que precisava de aprovação de não-sei-quem, mas que iam entrar um contacto, telefonar, enviar um mail, um pombo correio, sinais de fumo. Nada. Nunca me disseram nada. Tive de ser eu a andar a ligar para lá uma catrefada de vezes para voltar a ter seguro de saúde. Perante a prolongada falta de respostas, peguei em mim e fui à agência onde tinha feito o seguro, na esperança que alguém me ajudasse a resolver um problema que me parecia de fácil solução. Era pagar e pronto. Pois, não era pagar e pronto. Na agência acabaram por me explicar o que se estava a passar, o diálogo foi mais ou menos assim:
Senhor da Fidelidade: mas ninguém lhe disse que o serviço tinha sido anulado?
Eu: não… só me disseram que estava suspenso por falta de pagamento. Desde Abril que ando a tentar pagar e ninguém me diz como, já liguei uma data de vezes…
Ele: pois… mas o que estou aqui a ver é que o seu seguro não foi reactivado devido ao alto índice de sinistralidade.
Eu: como? O que é que isso quer dizer?
Ele: o índice de sinistralidade está associado ao número de ocorrências.
Eu: está a dizer-me que o seguro foi cancelado porque o usei demais?
Ele: pois, é mais ou menos isso. O nosso departamento comercial considera que não é vantajoso renovar o seu contrato.
Eu: está a dizer-me que me cancelaram um serviço que eu contraí porque, efectivamente, eu dei uso a esse serviço?
Ele: a senhora também tem uma empresa, deve compreender que há alguns clientes que não nos interessam.
Eu: não, de facto não compreendo nem vejo como é que isso pode ser aplicado ao meu caso. Tenho uma loja de roupa, vou dizer a um cliente que não me interessa que ele faça lá compras para eu não ter de pagar mais IVA?
Ele: mas a senhora não trabalha com sinistros!
Eu: pois não, nem quero! Esse é o vosso core, é o vosso negócio, não é o meu! E, já agora, o que é que se considera um alto índice de sinistralidade? Usar o seguro uma vez por mês?
Ele: não foi só uma vez por mês…
Eu: então foi o quê?
Ele: isso não sei, não tenho aqui os dados.
Eu: muito bem, como é que posso fazer uma reclamação formal?
Ele: eu vou pedir ao departamento comercial que volte a analisar a situação. Vão dizer que não, mas de qualquer forma espere que lhe envie um mail na segunda-feira a confirmar (isto foi a uma sexta)
Eu: mas se já me está a dizer que não vão aceitar para que é que tenho de esperar até segunda-feira?
Ele: eu só não lhe quero criar falsas expectativas.
Eu: não me está a criar qualquer espécie de expectativa. A partir do momento em que tratam os clientes desta forma, como imagina não tenho qualquer interesse em continuar ligara a uma empresa assim. Até porque o que não faltam aí são empresas concorrentes interessadas em que alguém lhes compre um seguro. De qualquer forma fico à espera do mail e agradeço que no mesmo indiquem que o seguro foi cancelado devido ao alto índice de sinistralidade, tal como me disse.
O mail chegou e o que é que dizia? Que o contrato não é reposto por falta de pagamento do prémio. Vai-se a ver e o discurso mudou. Lá devem ter percebido que era chato (e estúpido e talvez ilegal) dizerem que o meu seguro foi cancelado porque eu o uso em excesso e dou prejuízo à casa, por isso agora dizem que foi pela falta de pagamento. A Multicare deve estar a nadar em dinheiro (e está) para deitar fora clientes que em dez anos só se atrasaram no pagamento uma vez e que pagam o prémio máximo. Se eles quisessem mesmo que eu tivesse pago teriam insistido. Mas não, limitaram-se a cancelar o seguro sem sequer me avisarem disso. Nem um telefonema, nada. Pelo meio, cancelaram também um seguro de um bebé. Não é espectacular?
Ainda estou para perceber o que é isso de "alto índice de sinistralidade". É um facto que no ano passado devo ter usado mais o seguro. Estava grávida, havia mais exames, mais análises, mais tudo, mas nem sequer usei o seguro para o parto, fui para um hospital público, por isso gostava mesmo, mesmo, mesmo de saber onde é que me excedi. Quando contraímos um seguro é-nos dada uma tabela com os plafonds. Quando os ultrapassamos o problema é nosso, pagamos do nosso bolso. Ora se isso não me aconteceu, porque é que consideram que eu uso demasiado o seguro? O Mateus, então, acho que mal o usou. Entre passar o período de carência e lhe cancelarem o seguro, deve ter ido a uma consulta ou duas. De qualquer forma, ninguém vai ao médico ou se põe a fazer exames porque não tem coisas mais divertidas com que ocupar o dia. Vou ao médico quando preciso, e foi para isso que fiz um seguro, PARA O PODER USAR QUANDO PRECISO!
O problema é que parece que isto é prática comum. O cliente deixa de ser economicamente interessante e a seguradora põe-no a andar. Ala que se faz tarde, que aqui só nos interessam clientes que pagam muito e gastam pouco. Possivelmente isso está para lá algures nas letrinhas pequenas do contrato, confesso que ainda nem fui ver. Para já, para já, estou só absolutamente indignada com a ligeireza como as coisas são resolvidas, com a falta de comunicação e com a total falta de respeito para com o cliente. No mínimo, acho vergonhoso, sobretudo tendo em conta que era cliente há tanto tempo e que nunca lhes dei qualquer espécie de chatice. Se têm seguro de saúde com a Multicare é bom que comecem a usá-lo menos, porque pode bem acontecer-vos o mesmo.
Fosse o nosso sistema nacional de saúde uma coisa altamente eficiente e mandava-os dar uma curva, não queria mais seguro nenhum. Como não é, lá vou eu fazer um novo seguro de saúde, passar por um novo período de carência, e trá lá lá lá lá, que é disso que as seguradoras gostam. Como é que uma coisa que é suposto dar-nos saúde nos esfrangalha o sistema nervoso? Não é um contra-senso? Enfim. Quando regressar trato da reclamação. Não posso fazer mais nada, mas sempre fica lá no livrinho para se lembrarem da cliente abusadora que gastava uma fortuna em consultas.