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Fiz Erasmus e fui tãaaaaao feliz

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Foi no terceiro ano da faculdade que decidi candidatar-me ao programa Erasmus. Era uma coisa que sempre tinha querido fazer, por isso fui à secretaria, inscrevi-me sem avisar sequer os meus pais, e fiquei à espera. Os meus países preferenciais eram Espanha e Itália mas, basicamente, eu queria era ir, não me interessava muito o destino. Conhecia pessoas que tinham feito Erasmus e que diziam maravilhas sobre a experiência, por isso eu queria mesmo muito conseguir uma vaga. Mas como sabia que havia muita gente a querer o mesmo, nem sequer criei grandes expectativas.

A resposta veio ao final de umas semanas ou meses, já não me lembro:
tinha sido uma das seleccionadas e tinha uma vaga para a Università degli Studi di Siena, em Itália. Fiquei eufórica. Mas depois lembrei-me que tinha de contar aos meus pais, que precisava da autorização deles e, vá, do apoio financeiro, e a euforia acalmou substancialmente. Andei ali uns dias a ganhar coragem para lhes contar, mas lá me fiz à vida. Expliquei-lhes o que era o Erasmus, que achava que era uma boa oportunidade, que era importante que eu tivesse a experiência de estudar noutro país, etc e tal. A reacção deles foi o típico "primeiro estranha-se, depois entranha-se". Fizeram-me mil e uma perguntas, manifestaram os seus receios, mas depois, e como sempre, apoiaram-me. 

A perspectiva de ir um ou dois semestres para Itália era incrível, mas também ligeiramente assustadora. Era a primeira vez que iria ficar tanto tempo longe de casa, ainda por cima num país diferente, com uma língua que eu não dominava, a ter de desenrascar-me completamente sozinha. Ainda em Portugal, as primeiras duas coisas que tratei de fazer foi um curso de italiano (não podia ir para lá só a saber dizer "pizza" e "arrivederci") e arranjar casa. Tinha duas hipóteses: ir para uma residencial de estudantes ou partilhar uma casa com outras pessoas. Acabei por escolher a segunda, porque achei que era uma experiência mais gira e que me dava mais liberdade (não estava sujeita a regras, horários, etc).

Fui parar a um quinto andar sem elevador, uma casa enorme, com uma vista incrível para a cidade. Era suposto ter ficado a partilhar quarto com outra portuguesa da minha faculdade mas, à última hora, ela optou por ir para a residencial, por isso passei a ser a única portuguesa numa casa com um inglês, um italiano, um francês, três belgas e uma australiana (a casa era mesmo muiiiiito grande). Viver numa casa com tanta gente, com hábitos tão diferentes, tinha tudo para dar asneira e confusão. Estranhamente, não deu. Claro que discutíamos de vez em quando, por coisas parvas (quem é que comeu o meu iogurte? Quem é que foi tomar banho e não limpou a banheira?), mas dávamo-nos todos lindamente. Os belgas jantavam religiosamente às seis da tarde, o inglês era sempre o último a chegar do bar, o francês tinha uma lambreta na qual nos levava a dar umas voltas, o italiano fazia mega almoçaradas para toda a gente, a australiana era altamente religiosa e de chorar a rir. Éramos todos muito diferentes, todos tinham os seus amigos fora da casa, todos estudavam coisas diferentes, mas era rara a noite em que não saíamos juntos, ou que não ficávamos em casa a ver um filme ou a fazer qualquer coisa em grupo (mais não fosse as tarefas obrigatórias, tipo ir às compras ou limpar a casa).

Muitos dos meus amigos só ficaram um semestre em Siena, por isso, e apesar de ter a hipótese de ficar mais um, acabei por também só ficar aqueles seis ou sete meses. Meses absolutamente inesquecíveis e, sem dúvida, os melhores da minha vida de estudante. Aproveitei para continuar a aprender italiano, para viajar muito por Itália, para fazer amigos do mundo inteiro, para me divertir como nunca. Também ia às aulas, claro, mas não posso dizer que fosse a minha prioridade. Estava a par das matérias que estávamos a dar a cada cadeira, lia os livros obrigatórios e lá ia estudando em casa. Havia uma certa benevolência dos professores para com os estudantes Erasmus, por isso não eram muito intransigentes com a assiduidade, mas na avaliação eram exigentes. Os exames eram quase todos orais, em italiano, mas lá me safei, com notas decentes.

A primeira vez que vim a casa foi no Natal, ao fim de três meses. Estava a morrer de saudades, nunca tinha estado tanto tempo sem ver os meus pais mas, ao mesmo tempo, estava ansiosa por voltar para Siena. Lembro-me de chegar e de os meus colegas terem decorado a casa toda, para festejar o meu aniversário. Uns fofinhos. Actualmente, só tenho contacto com três deles (o italiano, um dos belgas e a australiana). No ano passado, quando voltei a Siena, percorri todas aquelas ruas, fui até à porta da minha antiga casa (o número 13 da Via Roma), bateu assim uma emoção.


Acho que toda a gente devia fazer Erasmus. Devia ser obrigatório. Para muitos, representa o primeiro corte umbilical, obriga-nos realmente a crescer. De repente, vemo-nos sozinhos num outro país e temos de nos fazer à vida. Gerir o dinheiro, tratar da casa, ter uma data de responsabilidades novas. E depois o lado humano, claro, o mais importante. Conhecer gente de todo o lado, habituarmo-nos a outros hábitos e culturas, partilhar experiências, exercitar a paciência, a tolerância, sair da nossa zona de conforto. Além disso, acho que ter uma experiência Erasmus no currículo é valorizado pelas entidades empregadoras. Significa que quem o fez tem espírito de aventura, capacidade de adaptação, de integração, de comunicação, o domínio de outra língua, etc.

Acredito que, para alguns pais, é uma decisão difícil de tomar, deixar ir assim os miúdos, largá-los rumo ao desconhecido. Os meus pais são ultra-protectores, por isso sei que lhes custou imenso, mas também sei que foi um voto de confiança que me deram. Sobretudo, sentiram que eu devia viver aquela experiência. Desconfio que se um dia o Mateus me vier dizer que quer fazer Erasmus irei de ficar de estômago embrulhado, mas como é que lhe poderei dizer que não, se é uma das coisas que mais me orgulho de ter feito e que recomendo a 300%?

O programa Erasmus celebra este ano o seu 30º aniversário e envolve quase 300 mil estudantes por ano e 33 países (os 28 estados-membro da União Europeia e também a  Turquia, a Noruega, a Islândia, o Liechtenstein e a antiga república jugoslava da Macedónia). A campanha dos 30 anos estará activa ao longo de 2017, sendo cada mês dedicado a um tema específico. Maio, por exemplo, é o mês da promoção da cidadania activa e solidariedade.

Obrigada à União Europeia, que me desafiou a contar a minha experiência Erasmus aqui no blog, e muitos parabéns pelo 30º aniversário deste programa incrível. Saibam mais aqui.

PS: Prometo que quando for a casa dos meus pais vou à procura do álbum de Erasmus para partilhar aqui algumas fotos. Medoooo.

#ErasmusPlus


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