Quando ouço as discussões sobre o possível aumento do salário mínimo sobem-me os calores e sinto vontade de partir pratos e atirar o comando à televisão. Discutem-se trocos. Trocos que, seguramente, farão a diferença na vida de alguém, por mais pequena que seja, mas que não deixam de ser valores irrisórios. O salário mínimo fixou-se em 485 euros em 2011 e não tem aumentado desde então. Os parceiros sociais discutem. Uns pedem que suba para 500, outros para 505€, e eu só consigo pensar no ridículo dos valores e em como é que se pode achar que alguém vive com isso. Com 485, ou com 500 ou com 505€. Mendiga-se um aumento como se se estivesse a pedir uma coisa extraordinária, uma coisa que permitisse às pessoas viverem de forma digna em vez de apenas sobreviverem. Ah, o país não pode, a produtividade não aumenta, não podemos pôr-nos agora a dar 700 ou 800 euros às pessoas. Estamos em 2014 e o salário mínimo em Portugal são 485 euros. Inacreditável, não é? Eu também já ganhei isso. Era miúda, morava com os meus pais, era o primeiro emprego. Mas quando comecei a fazer contas à vida, depressa percebi que era impossível ser independente com 500 euros por mês. Como é que se paga uma casa em Lisboa, mais as contas todas, e ainda se consegue comer? Sei que é a realidade de muitas pessoas, e juro que lhes admiro a ginástica orçamental, porque não sei mesmo como conseguem. Mas depois.... depois é triste que a vida se limite a isso: pagar a casa, as contas, a comida. Não temos de viver no luxo e na opulência, mas porra, há um meio termo. É bom saber que há uma margenzinha para ir ao cinema de vez em quando, ou jantar fora, ou comprar uma peça de roupa, fazer uma viagem assim na loucura, oferecer um brinquedo aos filhos, conseguir poupar para uma altura de crise. Como é que isso se faz com 485 euros por mês? Não se faz? Vive-se na rotina casa-trabalho-casa? Não se sonha? Vive-se sempre com a corda no pescoço, a pensar como é que se vai chegar ao fim do mês? Isso é viver? Lembro-me de viver angustiada com isso, o saber que não podia ter a minha independência, mas na altura era um mal menor. Tinha 20 e poucos anos e não era um drama assim tão grande viver com os pais e poder gastar o ordenado no que me apetecesse. Mas e se fosse agora? Se aos 33, com um filho, estivesse dependente de um salário mínimo, como é que conseguiríamos viver?
Juro que não percebo como é que o trabalho de alguém - seja ele qual for - pode ser "recompensado" com 485 euros. Ou como é que acham que alguém pode desempenhar as suas funções alegremente sabendo que é esse o valor que lhe cairá na conta ao fim do mês. É muito triste. Mas também não me vou pôr com a conversa típica de que é uma vergonha uns receberem tanto e outros tão pouco. Acho que todos deveríamos almejar viver melhor e com melhores condições, em vez de gastarmos energias a desejar que os outros vivam tão na merda como nós. Temos de nivelar as coisas por cima e não por baixo. O que é que me interessa rezar de joelhos para que a vizinha do lado ganhe tão mal como eu? Para ficarmos as duas na miséria e nenhuma se poder rir? Não é melhor fazer os possíveis para tentar estar tão bem como ela? Sei que nem sempre é fácil, que nem sempre depende de nós, que nem sempre o nosso trabalho é reconhecido, que tantas vezes nos sentimos injustiçados e com vontade de mandar tudo para o diabo, mas eu acredito (se calhar sou inocente) que quem é verdadeiramente bom acaba por ser recompensado.
Dia 30 haverá nova reunião. Ficaremos a saber se o salário mínimo aumentará 15 ou 20 euros. Farão a diferença para muita gente, mas não deixa de ser vergonhoso.