A água no Algarve não tem estado para brincadeiras. Estamos em plena época de marés vivas e a coisa anda agreste. Mas, não sei se por estar no Algarve e isto ser quase sempre uma calmaria, a malta não quer saber quando está bandeira amarela ou mesmo vermelha. Acho que é aquela coisa tipicamente portuguesa do “ah, a mim nunca me acontece nenhuma desgraça”. Mais ou menos como aquelas pessoas que se vão enfiar debaixo das rochas, apesar de todas as proibições, porque se um bocado da rocha caiu a semana passada é óbvio que não vai cair outro esta semana. Era preciso muito azar! E é com base neste pressuposto do “era preciso muito azar” que as pessoas se vão pondo a jeito para as desgraças. Eu sempre fui uma mariquinhas no que toca a aventuras marítimas, mas também sempre tive uns pais que não me davam grande margem de manobra para asneirar. Se estava bandeira amarela, na loucura podia pôr um pézito ali à beira de água, chapinhar debaixo da vigilância deles, mas se estava vermelha então nem me deixavam lá chegar. Ficava na areia a resmungar e não havia cá conversa para ninguém. Ontem à tarde estive um bom bocado à beira mar a apreciar o pessoal. Estava bandeira amarela, mas umas ondas enormes e que rebentavam com uma força que atirava ao chão tudo quanto era puto. E sim, o que não faltavam eram putos por ali, resmas deles, mínimos, e eu a ver quando é que vinha uma onda maior e os arrastava a todos. Uma ou duas mães estavam a observar, ligeiramente afastadas, e lá iam gritando “cuidado” ou “olha a onda” ou “já te disse para saíres da água”. Claro que os miúdos não ligavam nenhuma, e as ondas cada vez mais fortes. Mas nenhuma daquelas mãezinhas foi capaz de ir lá pegar nos putos e arrancá-los da água. Contrariar os meninos é que não, mais vale estar ali com os nervos em franja. Às tantas, claro, teve de vir o nadador-salvador berrar um “já chega!!!” e mandar toda a gente sair da água. E quando apitou para os adultos saírem, os que já andavam bem lá para a frente, foi incrível ver a quantidade de gente que fez de conta que não estava a ouvir e que lá continuou alegremente, ignorando os gritos e apitos. A sério, acham mesmo que os nadadores estão ali só para chatear? Que mandam as pessoas saírem da água porque se sentem aborrecidos e não têm nada mais giro para fazer? Fico doente com estas coisas. Odeio chicos-espertos e malta que acha que não tem de cumprir regras, ou que é imortal. Na segunda-feira, quando cheguei à praia, estava um miúdo de dez anos a ser reanimado pelo INEM, depois de o terem tirado da água, e saiu dali em mau estado. Fez-me muita impressão, não consigo imaginar o que é passar por um susto assim. Mas ao fim de dois minutos já andava toda a gente metida nas ondas. Bandeira vermelha? Ah, que se lixe! Enfim, há coisas que achamos serem de senso comum, mas pelos vistos não.
* uma expressão que, aparentemente, nem toda a gente conhece