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Channel: A Pipoca Mais Doce
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E se fosse comigo?

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Gosto muito do "E Se Fosse Consigo?", a rubrica da SIC que - e explico isto para quem viveu em Marte no último ano e só agora regressou - confronta os portugueses com situações encenadas de discriminação, violência ou preconceito em espaços públicos, para testar a capacidade de reacção das pessoas. Apesar de achar que não se pode fazer uma leitura simplista, do género "quem intervém é atento, preocupado, com uma forte consciência cívica e quem não faz nada é porque se está a cagar e é uma merda", a verdade é que a pessoa dá por si a pôr-se naquelas situações e a pensar "o que é que eu faria?". 

Em casa, no conforto do sofá, somos todos muito decididos, muito justos, muito racionais. Nenhum de nós tem dúvidas que entraria em acção, qual herói de capa e espada, pronto a salvar qualquer vítima que nos aparecesse à frente. Sabemos até que palavras usaríamos, um discurso muito coerente e ponderado. Mas no meio da rua, quando provavelmente até vamos com a cabeça no trabalho, na perna de peru que tem de se descongelar para o jantar ou no dentista que tem de se marcar para o mais novo, não acho estranho que algumas coisas nos passem ao lado. Atenção, se eu visse uma mãe a espancar uma criança, se eu visse um homem a arrastar uma mulher pelos cabelos (ou vice-versa), qualquer coisa assim muito óbvia, tenho quase a certeza que tentaria acalmar os ânimos, chamar a polícia, fazer qualquer coisa. Mas se passasse por uma discussão, por um tom de voz mais elevado, por uma troca de palavras mais alterada, não sei se não continuaria na minha vidinha. Não sei mesmo. Acho que depende muito do contexto, do sítio, de uma data de coisas. E por isso vivo no pavor de passar por uma qualquer situação, não fazer nada, e de repente ter a Conceição Lino a perseguir-me com um microfone e a perguntar "então? Porque é que não fez nada? Porque é que não reagiu? Hã? Hã? Hã? E se fosse consigo?".

Assim de repente, acho que nunca passei por nenhuma situação parecida com as que já passaram pelo "E Se Fosse Consigo?". Ou então ia mesmo muito distraída e não dei conta. Assim o máximo que já me aconteceu foi dizer a um grupinho de benfiquistas, à saída do Estádio da Luz, para pararem de provocar dois portistas que não estavam a chatear ninguém. Responderam-me "ah, mas quando nós vamos ao Porto também somos maltratados, nem sequer podemos usar a camisola do Benfica", como se isso servisse de desculpa. Não serviu, estavam só a ser parvos e eu não consegui ficar calada. Também já tive de pedir ajuda para uma vítima de violência doméstica, mas foi num contexto mais específico, por isso não sei se conta.

Acho que sou uma pessoa justa e atenta aos outros, mas não consigo jurar, assim com os dentinhos todos, que reagiria em todas as situações. Sem dúvida que o programa é um enorme despertar de consciências, acho que pode fazer com que todos nós passemos a estar um bocadinho mais atentos ao que nos rodeia, com que não vivamos tão virados para nós mesmos, mas também acho que há algumas situações um bocadinho exageradas e alguns conceitos que se confundem. Como o episódio de ontem, sobre maus tratos infantis, em que às tantas já se metia ao barulho agressões violentas e  uma palmada no rabo. Mas isso fica para outra oportunidade, que eu tenho coisas a dizer sobre o assunto e agora não tenho tempo.

E se fosse com vocês? Reagiam ou saíam de fininho?

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